Com o objetivo de entender melhor as motivações, os facilitadores e as dificuldades que jovens com deficiência intelectual encontram ao praticar atividades físicas, as pesquisadoras da Unifesp entrevistaram pessoas que poderão trazer essas respostas. Participaram da entrevista dois jovens que tem deficiência intelectual e uma profissional de Educação Física. Confira o resumo da entrevista:

Lucas Augusto, jovem com deficiência intelectual, atendido no Instituto Jô Clemente (IJC), tem 27 anos, mora com o irmão e os pais. Estuda, gosta de assistir televisão e, às vezes, ajuda os que trabalham no transporte escolar.

Em sua rotina, além dos estudos, vem ao IJC uma vez por semana, faz Pilates com o incentivo da mãe e conta que a motivação para começar o pilates foi o bem-estar da saúde mesmo.

Relatou que teve um pouco de dificuldade assim de ficar reto, a minha coluna, mas sabe que a atividade física ajuda na postura. Para não desistir, Lucas diz que faz pra ter um rendimento, uma qualidade de vida melhor porque, às vezes, quando fica deitado e sente dor nos pés e na coluna e o Pilates ajudou a melhorar um pouco a dor.

O recado de Lucas é para que você faça atividade física pois vai ajudar na sua qualidade de vida!

Gabriel Luiz, jovem com Transtorno do Espectro Autista (TEA), atendido no Instituto Jô Clemente (IJC), tem 22 anos e mora com os pais. Gabriel estuda e gosta de assistir desenhos e filmes.

Pratica atividade física todas as semanas, fazendo muaythai (um tipo de arte marcial) e dá aula de zumba (um tipo de dança). O que motiva Gabriel a praticar atividade física é a disciplina. Está na zumba desde 2015 e no muaythai desde 2018.

Quem o motiva é o mestre do muaythai, o nome dele é Carlinhos David. Ele o orientou na execução de todos os movimentos que a atividade requer, mesmo que não tenha relatado nenhuma dificuldade. Pra não desistir, Gabriel diz que se concentra no foco dele.

O recado de Gabriel é para que todo mundo faça atividade física, pede para que as pessoas saiam do sofá, pratiquem muitos esportes, dancem, faça as lutas (artes marciais), façam tudo o que vocês quiserem. E tudo na vida vai melhorar.

Profª Drª Nathalia Bernardes, formada em Educação Física, fez mestrado, doutorado e pós-doutorado voltado para área da medicina, focando na prática da atividade física como condução de diferentes patologias. Há aproximadamente cinco anos, iniciou mais especificamente na área da educação física adaptada e trabalha também com as pessoas com deficiência.

A atividade física tem impacto na vida das pessoas com deficência em diferentes aspectos, pois melhora a autonomia para as atividades da vida diária, gerando bem-estar. Além dos benefícios físicos, como a melhora de capacidade física e cardiorrespiratória, pode acontecer a melhoria na qualidade de vida da pessoa, nos aspectos, sociais, afetivos, cognitivos e comportamentais.

A prática de atividade física é muito importante e necessária para pessoas com deficiência porque serve como uma forma de estímulo. Por isso, a atividade física é indicada, sempre de maneira precoce, para que ela possa ajudar no desenvolvimento das pessoas com deficiência.

A realização da atividade física pode ser as atividades do cotidiano, coisas simples que se faz como: varrer a casa, arrumar a cama, conseguir pegar objetos e manipular, conseguir se deslocar andando com a marcha adequada. Tudo isso é possível ser trabalhado e estimulado com a atividade física.

Essas atividades podem gerar uma autonomia maior para a pessoa com deficiência quando ela está no ambiente do cotidiano. Também existem as questões de comportamento afetivo e social que podem ser trabalhadas quando a pessoa com deficiência participa de grupos e atividades de atividade física, que também são importantes para a qualidade de vida.

Como a deficiência intelectual é muito diversa, por exemplo: pessoas com síndrome de Down, em específico, têm uma porcentagem importante de casos de doenças cardiovasculares e obesidade. Essas alterações no metabolismo podem causar uma tendência a sobrepeso e obesidade.

As crianças, geralmente, podem ter mais infecções por decorrência. Adultos frequentemente podem apresentar alterações no metabolismo, ou seja, são uma população mais vulnerável. Por isso, a atividade física é importante para contribuir com a redução dos fatores de risco e para uma condição melhor de saúde.

As dificuldades que uma pessoa pode encontrar são várias:

  • Falta de acesso a uma prática de atividade física supervisionada, ou seja, locais disponíveis.
  • Ter opções variadas de atividades, porque é muito importante que pessoa faça uma atividade física que ela goste e que ela tenha alegria de fazer.
  • Há a questão financeira.
  • Falta de acessibilidade no espaço onde será realizada a atividade física (local acessível, equipamentos adaptados e políticas públicas)
  • Falta de supervisão e acompanhamento com um profissional preparado, se possível um atendimento personalizado e que seja adequado de uma forma segura para a pessoa realizar a atividade física de forma segura.

É muito importante que o profissional de Educação Física tenha atualizações e dedicação às pessoas com deficiência, e também realize o trabalho baseado nos quatro pilares da educação que são indicados pela Unesco: aprender a aprender, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser. Se tiver um olhar mais quantitativo, às vezes, não se alcança todos os benefícios que a atividade física pode oferecer.

Um ponto de atenção é que pais ou responsáveis que têm um perfil de superproteção podem reduzir a quantidade de estímulos que a pessoa com deficiência recebe. De uma forma direta, isso reduz a autonomia da pessoa e atrapalha o desenvolvimento das propostas que podem ser executadas na atividade física. Tamém é importante que os pais não fiquem juntos durante os exercícios, pois podem influenciar de alguma forma.

Também existe um desafio para quem trabalha com as pessoas com deficiência física, que é ter acesso adequado ao laudo e aos exames. É importante o acompanhamento multiprofissional para que o profissional de Educação Física possa adaptar as atividades físicas de acordo com as necessidades de cada um, por exemplo, às vezes a pessoa precisa de uma órtese, de uma prótese ou de uma cadeira adequada para o esporte. Então, tudo isso vai impactar como uma possibilidade de dificuldade para a prática de atividade física. Mas o mais importante é destacar que a atividade física é possível adaptar em relação a necessidade e o contexto em que a pessoa com deficiência está inserida.

O objetivo dos profissionais de Educação Física é desenvolver as potencialidades que são muitas e são diversas, em cada um. Acredito que esse é o maior desafio do profissional, além dos laudos.

Um ponto bem interessante nesse contexto é em relação às tecnologias, que também auxiliam bastante na atuação do profissional, como as tecnologias assistivas e as inovações tecnológicas. Além da troca entre diferentes profissionais na área da saúde, que permite realizar a atividade física de forma adequada e segura para a pessoa com deficiência. Então, o primeiro passo é começar a se movimentar.

Dependendo do esporte que você pratica, por exemplo: a arte marcial tem muito dessa relação de você ter essa disciplina. Então, nessa atividade física, a disciplina também é estimulada. Isso é muito interessante pois acaba repercutindo em outras áreas da vida da pessoa.

O Lucas e o Gabriel já trouxeram mensagem principal é que a prática da atividade física seja nas atividades da vida diária, reduzindo o tempo de sedentarismo para melhorar a vida da pessoa. Diferentes estímulos promovem diferentes benefícios. Pois há a melhora de força muscular, a capacidade cardiorrespiratória, a capacidade física, enfim. E isso vai ter uma repercussão nas demandas que eles precisam responder no dia a dia, mais disposição, foco, disciplina e por aí vai.

Então é exatamente o recado que eles deram que precisa se movimentar, sair do comportamento sedentário e buscar o que gosta de fazer. Faça a atividade que você conseguir e que seja possível fazer com frequência, porque não adianta ir uma vez e não frequentar, então o mais difícil é a persistência. Escolha algo que você tenha prazer de fazer.

Já o recado da Maju, da Unifesp, é que não adianta fazer nada forçado, é preciso fazer a atividade física com para receber mais benefícios ainda.