Quando o assunto são dietas específicas para determinadas condições de saúde muitas pessoas acham que existe certo exagero no cuidado com a alimentação, especialmente das crianças. Rotineiramente ouvem-se frases como “Ofereci esse alimento para os meus filhos e não aconteceu nada. Veja como estão fortes!”.
Para esse tipo de argumento vale sempre a máxima de que conhecimento nunca é demais. Cada pai e mãe é soberano na educação alimentar dos filhos, mas cabe a nós, profissionais e instituições sérias, oferecer informações e apoio para que a alimentação seja um ato de cuidado com a saúde dos pequenos (e dos adultos também).
É muito comum ouvirmos relatos de familiares durante atendimentos em nossos consultórios e serviços nos quais atuamos. Uma história clássica é a de uma paciente na época da Páscoa cujo tio, que já sabia de todos os riscos, achou que a mãe da paciente exagerava nos cuidados e isso afastava os primos do convívio com a pequena. Para solucionar um problema que só existia na cabeça dele, esse tio comprou um ovo de Páscoa daqueles bem grandes e promoveu uma festa para a criançada da família. O resultado foi a internação da menina de 3 anos por mais de 10 dias e um risco enorme de morte. Depois disso, o tratamento para desnutrição e desidratação perdurou por mais de 1 ano ainda.
Muitas crianças com alergia à proteína do leite de vaca ou celíacas sofrem com a postura de familiares próximos que não entendem realmente a necessidade da exclusão do leite de vaca e do glúten da dieta, respectivamente. Outro erro comum é confundir a alergia à proteína do leite de vaca com a intolerância à lactose. Quando uma criança recebe o diagnóstico de alergia à proteína do leite de vaca significa que ela não poderá consumir nenhum alimento que contenha leite. Já a intolerância à lactose não ativa o sistema imunológico e, portanto, o leite e derivados podem ser consumidos, desde que tenham sido processados com a enzima lactase. O risco de se oferecer um iogurte sem lactose para uma criança alérgica, por exemplo, vai desde a destruição da parede intestinal até a evacuação com sangue e, em alguns casos mais graves, a morte. Por isso é importantíssimo seguir a dieta corretamente.
Se esse já é um grande problema para essas duas doenças que hoje são cada vez mais divulgadas e diagnosticadas, imagine a sitação de pessoas que convivem com doenças mais raras. Doenças, por exemplo, cujo tratamento é a exclusão de carnes e outras proteínas animais da dieta? Nesses casos, os familiares mais próximos costumam acatar as recomendações da equipe médica e dos nutricionistas, pois entendem que oferecer alimentos proibidos só aumenta a gravidade da doença, que podem acarretar sequelas permanentes e incapacitantes.
Por outro lado, há um contingente de pessoas que até toma os devidos cuidados, mas insiste que “só um pouquinho não faz mal”. São pessoas geralmente bem intencionadas, mas que colocam em risco a vida da criança por desrespeito às orientações recebidas. Como resultado a criança sofre demais, fisicamente e emocionalmente, pois inicia-se o processo de rejeição daquele alimento por medo da dor e sofrimento que ele causa. Muitos desenvolvem até o medo de comer, pois não entendem ainda quais alimentos são seguros.
Falar claramente sobre as dificuldades alimentares cria uma rede de apoio e ajuda e isso é fundamental para a segurança física, emocional e nutricional das crianças. Explicar (às vezes várias vezes) quais alimentos não podem ser consumidos faz parte da rotina do guardião/tutor. Preparar alimentos em casa e obedecer as restrições e recomendações nutricionais é fundamental para o sucesso de qualquer tratamento e/ou dieta. Sabemos que é trabalhoso e cansativo, às vezes até exaustivo, mas absolutamente necessário.
Várias são as alternativas para manter a linha na hora da alimentação: desde comidas congeladas produzidas por profissionais e empresas sérias (independentemente de serem grandes ou pequenos negócios) até alimentos industrializados cujos rótulos sejam detalhados e precisos.
Entender que a segurança alimentar caminha junto com a informação é a chave para que a vida social transcorra tranquilamente. Algum familiar discorda da dieta? Ele não precisa necessariamente concordar, mas deve respeitar e cumprir. A criança sente falta de algum alimento proibido? Se a dieta for seguida rotineiramente desde cedo não haverá lembrança de sabores e, portanto, ela não sentirá falta de nada que seja probibido para elaa. Ela vê amigos e colegas consumindo determinado alimento e fica com vontade? Nada que uma boa conversa e a substituição por um alimento que ela possa consumir para driblar esse tipo de situação. Tudo isso para que a dieta dela fique resgardada e ela protegida sempre.
Autora: Vanderlí Marchiori, nutricionista e fitoterapeuta.